Dificuldades de Aprendizagem - Discalculia
A Discalculia
Eis a última das
dificuldades de aprendizagem: a discalculia. Etimologicamente, discalculia deriva dos conceitos “dis” (desvio) + “calculare” (calcular, contar), ou seja, é “um distúrbio de
aprendizagem que interfere negativamente com as competências de matemática de
alunos que, noutros aspetos, são normais.”. Assim, trata-se de “uma desordem
neurológica específica que afeta a habilidade de uma pessoa compreender e
manipular números.”. Indicadores estatísticos dizem-nos que a maior parte dos
alunos revela problemas na aprendizagem desta disciplina. Muitos deles não
compreendem os enunciados dos problemas, outros demoram muito tempo a perceber
se precisam de somar/dividir/multiplicar e alguns não conseguem concluir uma
operação aparentemente simples. É importante referir, no entanto, que estas
dificuldades podem não estar associadas a fatores como a preguiça/desmotivação/desinteresse (como alguns
pais/professores julgam), mas relacionadas com a discalculia.
Causas
Não existe uma causa única e simples que possa
justificar o aparecimento da discalculia. Os estudos efetuados nesta área
são recentes e as conclusões não podem, ainda, ser generalizadas. No entanto, têm sido feitas
investigações em vários domínios, como a neurologia, a linguística, a
psicologia, a genética e a pedagogia. O desenvolvimento neurológico é caracterizado pelas
diferentes funções do sistema nervoso que se vão estabelecendo ordenada,
progressiva e cronologicamente, ou seja, cada nível etário de maturação
corresponde ao desenvolvimento de novas funções (percepção, espaciotemporal,
lateralidade, ritmo) resultantes de experiências que produzam estímulos
adequados. Nesta linha,
distinguem-se três graus de imaturidade neurológica que permitem a definição de
graus de discalculia correspondentes: 1) grau leve, quando
a criança discalcúlica reage favoravelmente à intervenção terapêutica; 2) grau médio, que coexiste com o quadro da maioria dos que
apresentam dificuldades específicas em matemática; 3) grau limite,
quando se verifica a existência de uma lesão neurológica gerada por
traumatismos que provocam um défice intelectual.
No domínio da linguística, afirma-se que a
compreensão matemática só é possível com a assimilação da linguagem, que tem um
papel fundamental na evolução do intelecto de cada ser humano. Neste caso, um
discalcúlico apresenta deficiente elaboração do pensamento devido às
dificuldades no processo de interiorização da linguagem. Estas crianças
revelam défices na compreensão de relações e também na sua reversibilidade e/ou generalização; apresentam,
ainda, dificuldades na resolução de problemas, mais especificamente no
simbolismo numérico (correspondência número-quantidade), bem como na sua
representação gráfica. Na área da psicologia, as conclusões apontam para o fato
dos indivíduos portadores de alterações psíquicas se tornarem mais propensos a
apresentar problemas de aprendizagem, pois o aspeto emocional interfere no
controle de determinadas funções, é o caso da memória, da atenção e da percepção,
por exemplo. Existem também explicações de base genética apontando para
a determinação de um gene responsável pela transmissão dos transtornos ao nível
dos cálculos. Embora existam registos significativos de antecedentes
familiares de crianças com discalculia que também apresentam dificuldades na
matemática, os estudos de hereditariedade/genética carecem ainda de
aprofundamento e comprovação. Por último, as conclusões na área da pedagogia vêm apontar
a discalculia como uma dificuldade diretamente relacionada com os fenómenos que
sucedem no processo de aprendizagem, como métodos de ensino desadequados,
inadaptação à escola, entre outros.
Caraterização
As crianças com discalculia apresentam, em
testes de inteligência, desempenhos superiores nas funções verbais
comparativamente às funções não verbais, isto é, um QI verbal superior ao QI
não verbal/realização. São crianças que
revelam um ritmo de trabalho muito lento usando, muitas vezes, os dedos para
contar. São ansiosas,
desmotivadas e têm receio de fracassar, consequência do menosprezo ou repressão
por parte dos colegas de turma, professores e/ou pais/familiares. Uma criança
discalcúlica apresenta dificuldades a vários níveis:
• Na compreensão e
memorização de conceitos matemáticos, regras e/ou fórmulas;
• Na sequenciação
de números (antecessor e sucessor) ou em dizer qual de dois é o maior;
• Na diferenciação
de esquerda/direita e de direções (norte, sul, este, oeste);
• Na compreensão de
unidades de medida;
• Em tarefas que
impliquem a passagem de tempo (ver as horas em relógios
analógicos);
• Em tarefas que
implicam lidar com dinheiro;
• Na resolução de
operações matemáticas através de um problema proposto (podem compreender
“3+2=5”, mas incapazes de resolver “A
Maria tem três bolas e o João tem duas; quantas bolas têm no total?”);
• Na
correspondência um a um/correspondência recíproca;
• Na conservação de
quantidades;
• Na utilização do
compasso ou até mesmo da calculadora (reconhecimento dos dígitos e símbolos
matemáticos).
Estas dificuldades
podem conduzir, em casos extremos, a uma fobia à matemática.
Intervenção
A matemática é uma disciplina extremamente
importante para o dia-a-dia, uma vez que se lida com números e realizam-se
cálculos em inúmeras situações do cotidiano. Deste modo, o primeiro aspecto
a ter em conta na intervenção com uma criança com discalculia é, precisamente,
fazê-la perceber o quão importante é dominar esse pretenso “bicho-de-setecabeças” fornecendo-lhe
exemplos das vantagens obtidas no seu dia-a-dia: ao ver televisão (reconhecimento dos
canais televisivos); ao jogar no computador (número de níveis
concluídos/alvos abatidos); ao jogar à bola (contar o número de gols/analisar
distâncias para a marcação dos penaltis); ao brincar com casas de bonecas
(dimensões dos
quartos/cozinha). O educador deve, sempre que possível, planear atividades
que facilitem o sucesso do aluno e que o ajudem a melhorar o seu autoconceito e
a sua autoestima. Pode, por exemplo, recorrer à utilização de jogos e outros
materiais concretos que promovam a manipulação por parte da criança: é importante que
a criança possa observar, tocar, mexer num cubo quando está, por exemplo, a
aprender os sólidos geométricos, caso contrário será difícil compreender as
noções de lado, vértice e aresta.
O uso da calculadora deve ser permitido, bem
como a consulta da tabuada, pois estas crianças têm, tal como já foi referido,
dificuldades ao nível da memória; assim, podem ser capazes de resolver um exercício (raciocínio correto), mas incapazes de
realizar as operações matemáticas necessárias para a sua conclusão. Para finalizar,
resta acrescentar o fato de que o diagnóstico de discalculia é sempre (e apenas) uma descrição do
atual período de desenvolvimento, aplicável por um período máximo de um ano. Como a criança
está em constante desenvolvimento, as dificuldades que existem no ano anterior
podem ser minimizadas no ano seguinte. Se o aluno receber a
intervenção adequada, a possibilidade de desenvolvimento das capacidades
matemáticas é grande. No entanto, muitas vezes, algumas destas dificuldades permanecem
de uma forma suave (recordar dados numéricos, por exemplo) por toda a sua
vida. Entende a
importância disso? Espero que sim porque é nosso dever
ajudar aqueles que infelizmente possuem essas dificuldades. Essa é a última dificuldade de aprendizagem da qual
vamos falar aqui, então façam bom uso desse conteúdo gurizada, beijos de luz!
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